Padres omissos: ruína das almas.

13/03/2024

Trecho de São Gregório Magno retirado de sua obra "Regra Pastoral", editora Paulus, p. 36-38


Que o pastor guarde um silêncio discreto e tenha uma palavra útil.

Que o pastor guarde um silêncio discreto e tenha uma palavra útil: não revele o que deve calar e não cale o que revelar. Uma palavra imprudente conduz ao erro, um silêncio excessivo mantém no erro aqueles que poderiam ser instruídos. Temendo perder o favor popular, acontece, com frequência, que pastores imprudentes não ousem dizer livremente onde reside o bem e, então, segundo a palavra da Verdade,13 não cuidam do rebanho, a eles confiado, com a dedicação do pastor, mas agem como mercenários que fogem quando vem o lobo, escondendo-se no seu silêncio.14 Assim, o Senhor os admoesta, por meio do profeta, dizendo: Cachorros mudos que não sabem latir.15 E se lamente deles: Vós não subistes contra o inimigo para enfrentá-lo, nem construístes muralha para que a casa de Israel pudesse resistir no combate, no dia do Senhor.16 Subir contra o inimigo é contrastar os poderes deste mundo, falando livremente em defesa do rebanho. Resistir no combate no dia do Senhor é resistir, por amor da justiça, aos ataques dos perversos. Para um pastor, ter medo de dizer o bem não significa, por este silêncio, voltar as costas? Mas, se enfrenta o perigo pelo seu rebanho, ele opõe ao inimigo uma muralha para a casa de Israel.

Por isso, se diz ainda ao povo que peca: Teus profetas viram para vocês coisas falsas e insensatas e não te revelaram tuas iniquidades para conduzir-te ao arrependimento.17 Na Sagrada Escritura, às vezes, os profetas são chamados doutores, porque, mostrando que o presente é fugaz, eles revelam o que haverá de suceder. Mas a Palavra divina denuncia as suas falsas visões, quando eles, pelo temor de corrigir os vícios, adulam os pecadores com uma vã promessa de segurança. Eles não abrem os olhos sobre a iniquidade dos pecadores, quando calam a voz que os corrigiria. Chave que abre é a palavra que corrige: com a repreensão, desvela a culpa, da qual, com frequência, não adverte a malícia, nem mesmo quem a cometeu. Por isso, Paulo diz: Para que seja capaz de exortar segundo a sã doutrina e refutar os que a contradizem.18 E assim também Malaquias afirma: Os lábios dos sacerdotes hão de guardar o saber, e é da sua boca que se buscará a doutrina, porque é um mensageiro do Senhor dos exércitos .19 Por meio de Isaías, o Senhor admoesta, dizendo: Grita a plenos pulmões, sem cessar, levanta a voz como trombeta .20 Todo aquele que acende ao sacerdócio recebe o encargo de arauto: ele avança, gritando, antes da terrível vinda do Juiz. Portanto, se o sacerdote não sabe pregar, como poderá fazer ouvir a sua voz o arauto mudo?

Por isso, o Espírito Santo pousou sobre os primeiros os pastores, em forma de línguas;21 aqueles que ele plenificou se tornaram prontamente, sob sua inspiração, homens capazes de falar. Também por isso se ordena a Moisés que o sacerdote, ao entrar na Tenda, levasse ao redor de si os sininhos, para dar assim anúncios de pregação e não ir, com o seu silêncio, ao encontro do juiz que o observa do alto. De fato, está escrito: Para que se ouça o tilintar dos sininhos quando entra no santuário, e quando sai, na presença do Senhor, e assim não morra.22 Quando entra ou sai sem que se ouça a sua voz, o sacerdote morre, porque atrai sobre si a ira do juiz invisível; ele caminha sem que ressoe a sua pregação. Com razão, é prescrito que os sininhos sejam pendurados nas suas vestes. O que devemos ver nas vestes do sacerdote, senão boas obras? O profeta atesta: Que os teus sacerdotes se revistam de justiça.23 Os sininhos são pendurados nas vestes para que as obras do sacerdote, unidas ao som de seus lábios, da palavra, proclamem onde se encontra o caminho da vida. Mas, quando o sacerdote se prepara para falar, coloque toda atenção e reflexão, e o faça com grande cautela; se ele se deixar arrastar por um desejo desordenado de falar, o coração daqueles que o ouvem poderá ser atingido pela ferida do erro, e querendo passar por sábio, romperia, de modo insensato, os laços da unidade. Por isso, diz a Verdade: Tende sal em vós, e conservai a paz uns com os outros .24 O sal significa a sabedoria da palavra. Quando se esforça por falar sabiamente, tenha grande temor de turbar pelo seu discurso a unidade dos ouvintes. Donde o que Paulo diz: Não ser sábios mais do que convém, mas ser sábios com moderação.25 Por isso, na veste do sacerdote, segundo a Palavra divina, aos sininhos se juntam as romãs.26 O que significam essas romãs senão a unidade da fé? 

De fato, na romã, os numerosos grãos em seu interior são protegidos por fora por uma só casca exterior; do mesmo modo, a unidade da fé protege os inumeráveis povos da santa Igreja, contendo dentro de si diversidade de méritos. Para que o pastor imprudente não se meta apressadamente a falar, como já dissemos, a Verdade mesma grita aos seus discípulos: Tende sal em vós, e conservai a paz uns com os outros. Como se, através da figura da veste do sacerdote, dissesse: "Acrescentai romãs aos sininhos para que, em tudo o que dizeis, possais conservar, com vigilante atenção, a unidade da fé".

Além disso, os pastores devem ter o cuidado de não somente não fazer discursos errôneos, mas devem também evitar dizer a verdade de modo prolixo e desordenado. Porque, muitas vezes, as palavras perdem a sua força sobre o coração dos ouvintes, por causa de uma loquacidade desconsiderada e inoportuna (Nota do blog: muitos padres acham que isso quer dizer que eles podem atrasar em falar a verdade até "os ânimos acabarem", mas é uma distorção completa do texto, pois o que não se pode fazer é falar, sem preparo, as verdades, de tal modo que as pessoas não entendam nada) . Essa loquacidade, incapaz de servir, com proveito, aos seus ouvintes, contamina também aquele que a exercita. Por isso se diz oportunamente por meio de Moisés: O homem que sofre de um fluxo de sêmen será impuro.27 Na verdade, na alma do ouvinte, a boa qualidade do discurso proferido faz das palavras ditas o sêmen de um pensamento que se formará; o ouvido acolhe uma palavra, e na mente é gerado um pensamento. "Semeador de palavras", tal foi justamente o apelido dado ao pregador por excelência pelos sábios deste mundo.28 O homem que sofre de um fluxo de sêmen é, portanto, declarado impuro; escravo de sua loquacidade, ele se contamina com o que, expresso de modo ordenado, poderia gerar no coração dos ouvintes um pensamento justo; mas, com seu fluxo de palavras imprudentes, derrama o sêmen para contaminar e não para o bem de uma descendência. Assim, Paulo, exortando seu discípulo da urgência da pregação, lhe diz: Rogo a ti, diante de Deus e de Jesus Cristo, que há de vir para julgar os vivos e os mortos, pela vinda do seu Reino: proclama a Palavra, insiste no tempo oportuno e inoportuno.29 Antes de dizer inoportuno, antepôs oportuno, porque a palavra inoportuna, se não considera o que é oportuno, perde toda eficácia na mente de quem ouve.

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